Análise: Teatro Oficina

O BANQUETE Foto Renato Mangolin 200
O BANQUETE Foto Renato Mangolin 200
Trecho de Bacantes: Ideia de um teatro que perturba e inquieta (Foto: Rafael Mingolin/Divulgação)

OFICINA UZYNA UZONA, UM TEATRO EM REVOLUÇÃO PERMANENTE
Com mais de 50 anos de existência, o grupo liderado por José Celso Martinez Correia não deixa de renovar-se e surpreender

Por Alexandre Figueirôa
Editor da Revista O Grito!, no Recife

As origens do Oficina remontam ao final dos anos 1950 quando surgiu como companhia teatral amadora com a intenção de se distanciar de estética burguesa do Teatro Brasileiro de Comédia – o TBC e do nacionalismo político do Teatro de Arena. As principais influências da primeira fase foram as idéias existencialistas de Jean Paul Sartre e Albert Camus. Um dos fundadores do Oficina, José Celso Martinez Correia, tornou-se uma figura ímpar no teatro brasileiro e desde então acompanha e lidera o grupo que sempre mostrou em todas estas décadas sua vocação para transgredir e renovar a prática teatral.

Nos início dos anos 1960 o grupo montou autores como Gorki (Os Pequenos Burgueses) e Tennessee Williams (Um Bonde Chamado Desejo) e já dialogava com as técnicas e propostas estéticas de Constantin Stanilavski e Bertolt Brecht. Mas foi em 1967, com a montagem de O Rei da Vela, de Oswald de Andrade, que o Oficina provocou uma mudança radical na cena brasileira. O espetáculo é considerado o marco inicial do movimento tropicalista e influenciou a música, o cinema e as artes plásticas a partir de uma recusa dos padrões que norteavam a cultura brasileira pós-golpe de 1964. José Celso estava à frente desta ruptura denunciando o populismo da arte nacional e polemizando com o papel do artista criador. Ele questionou como ninguém a autonomia do código cênico e discutiu o sentido de um teatro revolucionário e suas relações com o público.

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Com Roda Viva, musical de Chico Buarque de Holanda, no final dos anos 1960 e Gracias Señor, em 1971, este, um exercício de criação coletiva, o Oficina surpreendeu mais uma vez pela ousadia e radicalização da linguagem usada no palco. Em 1974, José Celso foi preso e exilado pelo regime militar só voltando ao Brasil em 1979. Na década de 1980, o Oficina se tornou Uzyna Uzona e sua ação ficou mais limitada, realizando apenas oficinas, leituras de textos e algumas encenações de curta duração. No início dos anos 1990 o Oficina reabriu as portas do seu teatro na rua Jacequai, no bairro do Bixiga, em São Paulo, que estava fechado desde 1974 depois de um incêndio.

Nesta década, o Oficina foi retomando o ritmo de suas atividades e realizou espetáculos intensos incorporando o vídeo, a música, e consagrando a sua experiência de criação coletiva. Montou peças como As Boas, de Jean Genet e As Bacantes, a tragédia grega de Eurípedes, um projeto assinado pelo próprio José Celso e cuja encenação acontece como sendo uma ópera de carnaval para louvar Dionisyos, o deus do Teatro. Recentemente, ele realizou Os Sertões, a partir do texto do livro de Euclides da Cunha, um projeto dividido em cinco espetáculos e que foi apresentado na íntegra, no Recife, em 2007.

A trajetória de José Celso é de uma riqueza inigualável, sendo ele um nome fundamental para as artes cênicas no Brasil. Artista combativo, polêmico, inquieto, foi ele quem mais ousou no Brasil desde os anos 60. Fica claro em toda sua carreira, em que se mesclam erros e acertos, a sua doação a um teatro concebido para um projeto cênico que perturbe o cotidiano da platéia e que provoque no espectador uma reação não apenas superficial, mas que mexa com sua consciência.

O projeto Dionisíacas em Viagem, que já percorreu cidades como Brasília e Salvador, chega ao Recife nesta semana e é a prova da vitalidade deste grupo incontornável. Na Refinaria Cultural Nascedouro de Peixinhos, em uma estrutura montada especialmente para as apresentações (o Teatro Extádio, com capacidade para duas mil pessoas) serão mostrados os espetáculos Taniko, o Rito do Mar (dia 07 de julho); Estrela Brazyleira a Vagar – Cacilda (dia 08); Bacantes (dia 09) e O Banquete (dia 10). Entre técnicos, produtores, músicos e artistas, o Carronaval das Dionisíacas, tem 57 pessoas, além da equipe de v ídeo que grava todos os espetáculos. Uma experiência para vivenciar e lembrar que o teatro é capaz ainda de provocar transformações na nossa relação com a vida.

A OFICINA EM VÍDEOS

O grupo fez vídeos das oficinas de atuação em Peixinhos, Olinda. Uma delas, um coro de participantes, canta e dança para discutir Chico Science. Outro vídeo mostra um grupo vendo a partida do jogo do Brasil, em que foi eliminado pela Holanda na Copa do Mundo. A todo tempo, Zé Celso, pede: “descruze os braços”