Crítica: Os Descendentes, de Alexander Payne

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EM CRISE
Filme Os Descendentes usa Havaí como metáfora para mostrar como personagens estão desolados por dentro enquanto vivem no paraíso

Por Paulo Floro

É muito fácil repousar no clichês e curtir a vida sem muitos riscos nem muito esforço. É essa a ideia que acreditamos vigorar no Havaí, terra que automaticamente remete à coisas boas, hula-hula e mulheres bonitas. O diretor Alexander Payne (o mesmo de Sideways) decide dar um choque em todos esses lugares-comuns logo de início ao mostrar um clipe com imagens feias da ilha e a mulher do protagonista internada em coma profundo após um acidente de barco.

Payne decidiu usar a ilha para falar de um mundo que repousa sobre um exterior muito bonito, mas que esconde mazelas e tristezas como qualquer outro lugar. George Clooney interpreta Matt King, advogado descendente de uma rainha nativa e de um colonizador que deixaram como herança milhares de hectares de terra pertencentes à então realeza do local. Envolto em uma negociação de meio bilhão de dólares com a venda das terras, ele precisa lidar com os anseios de toda a família, já que é o único responsável por gerir o negócio.

Se por um lado todos os familiares ficarão felizes pelo montante de dinheiro, por outro a população deverá lidar com mais resorts num dos poucos locais ainda intocáveis do Havaí. Esse senso de responsabilidade com o passado é apenas um dos dilemas que Matt precisa lidar. Seu maior problema é o relacionamento com suas filhas e a mulher em coma. Alexander Payne fez uso de metáforas do arquipélagos para mostrar como todos estão fechados em si mesmos, pulando de ilha em ilha, mas sem necessiariamente chegar à algum lugar.

Matt precisa lidar com suas duas filhas com quem sempre teve pouco contato e com a revelação de que sua mulher, com quem vivia um casamento conturbado, o estava traindo. Ele parte então numa busca pelo amante, homem que, de fato ela amava. O grande interesse do filme está em como o personagem de Clooney resolve todas essas questões e como tudo isso está ligado à natureza do local.

Apesar das críticas de que está mais domesticado, este é um dos trabalhos mais interessantes de Alexander Payne. Se em Sideways e Eleição ele possuía um texto mais cínico e corrosivo, em Os Descendentes, ele decidiu explorar o paraíso do cenário como metáfora para a desolação que os personagens sentem por dentro. É também comovente na medida sem soar piegas. A cena em que Matt King discute com sua mulher em coma no hospital é, ao mesmo tempo ridícula e tocante.

O filme ainda tem sido muito aclamado pelo conjunto de atuações. De Clooney, por enfim enfrentar um papel em que não esteja em sua zona de conforto como galã. E da revelação Shailene Woodley, que ficou com um dos papeis mais importantes do filme e segurou bem a missão. É um daqueles filmes que são melhor aproveitados quando há entrega por parte do espectador (para chorar à vontade).

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Alexander Payne
[The Descendants, EUA, 2011]
Fox Searchlight

Nota: 8,3