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Foto: Divulgação.

No Ar Coquetel Molotov 2022: o afro-futurismo de GLOR1A chega ao Brasil pela primeira vez

Multiartista da música eletrônica tem inspirações na ficção científica e no folclore africano. Seu som exalta o empoderamento feminino, preto e queer

Colaborou Matheus Nascimento.

“Sempre conto histórias sobre corpos negros femininos queer do futuro e como eles podem ser percebidos pela sociedade e também pela tecnologia”, é como a multiartista britânica GLOR1A define a presença do afrofuturismo em seu trabalho. Pela primeira vez no Brasil, a artista aporta no Recife como um dos pontos altos do No Ar Coquetel Molotov deste sábado (19).

O show de GLOR1A acontece no palco Kmkaze, a partir de 23h10, nesta volta do festival ao Campus da UFPE.

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Com inspirações na ficção científica e no afrofuturismo, a artista desenvolve um trabalho que exalta o empoderamento feminino, preto e queer. A originalidade de suas propostas tem como destaque a música eletrônica e performances tecnológicas revolucionárias, ao inovar musical e visualmente.

Seu último EP lançado em abril deste ano, METAL REBOOT$D é uma releitura de seu segundo trabalho METAL, que tem como premissa explorar um mundo pós-lockdown através dos olhos de um robô.

A Revista O Grito! conversou com a cantora às vésperas do No Ar.

Seu trabalho traz referências do afro-futurismo. Na sua opinião, qual a importância desse movimento artístico para a música e como ele aparece no seu trabalho?

Sempre conto histórias sobre corpos negros femininos queer no futuro e como eles podem ser percebidos pela sociedade e também pela tecnologia, basicamente onde nos situamos. E acho muito importante começar a pensar no futuro primeiramente nestes termos, para que possamos criar nossas próprias narrativas para nossos próprios corpos, em vez de uma narrativa ser criada para nós. Sabe, fiquei muito, muito interessada nessa ideia de futurismo e em meu próprio corpo quando comecei a ler sobre discriminação em algoritmos, dados, realidade aumentada e inteligência artificial. Foi muito interessante porque era como se essa ideia de supremacia branca estivesse voltando na tecnologia do futuro, e se não encararmos o problema de frente e fizermos algo a respeito, acabaremos em um Estado opressivo novamente. Então, pensar nessas histórias futuristas nos permite nos colocarmos da forma que queremos ser no futuro, basicamente.

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“Eu nem sabia que estava fazendo afro-futurismo enquanto fazia afro-futurismo”. (Foto: Divulgação).

A tecnologia desempenha um papel importante no seu trabalho. Você pode nos contar um pouco sobre sua relação com a tecnologia e a interseção que ela tem com a música?

A tecnologia desempenha um papel importante na minha música muito bem por causa do afro-futurismo. Mas, para ser sincera, eu nem sabia que estava fazendo afro-futurismo enquanto fazia afro-futurismo (risos). Até que comecei a ler sobre outros afro-futuristas como Drexciya, essa dupla incrível dos EUA. Eles são uma dupla eletrônica dos anos 1990 e criaram histórias baseadas no mito de Drexiya [nota do editor: um mito afro-futurista sobre uma civilização submarina). Isso realmente me inspirou a continuar pensando sobre essas ideias de tecnologia e as histórias sobre tecnologia e como elas me afeta. Meu último EP, Metal, apresenta ao público o Glor1a 2.0, que era uma robô negra que percorria a Terra marcando as pessoas e escaneando o reconhecimento facial delas. Eu criei essa ideia porque pensei, tipo, se as empresas realmente tivessem nossa maior mercadoria elas teriam nossos rostos. Todos os nossos detalhes sobre ser humano. Que diferença faria avançar para a segurança, para coisas como publicidade, privacidade também?

Então eu apresento Glor1a 2.0 em Metal, meu último EP e eu realmente amei criar esse conceito porque me permitiu criar histórias como Drexcya fez, colocar as pessoas em um mundo de fantasia. Mas é um futuro bem próximo e pode se tornar realidade. Então, sim, a tecnologia é uma parte muito, muito importante.

Mais recentemente tenho observado tecnologias mais naturais e redes de comunicação naturais por meio de árvores e plantas e como as árvores têm sua própria Internet, basicamente e coisas assim. É muito, muito interessante para mim porque nos permite pensar sobre esse código natural que está acontecendo desde o início dos tempos e como isso realmente se infiltra na vida humana. E isso se encaixa muito bem no projeto que estou fazendo no festival neste fim de semana. E é chamado de Brief Pod. A ideia é: e se humanos e árvores pudessem se comunicar? Bem, e se as informações fossem passadas umas para as outras para salvar nosso planeta? Então, sim, grandes ideias, pequenas ideias vêm de todas as formas.

Escrevi o EP durante o lockdown da Covid-19 e criei essa ideia de Glor1a 2.0. Mas queria cimentar esse novo personagem em um cenário e pensei: e se desligássemos a Internet por um dia? O que isso faria? Teria efeitos benéficos para a sociedade ou causaria o caos? E é basicamente disso que se trata Metal.

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Cantora lança no Brasil o EP Metal. (Divulgação).

Sua mistura de R&B e música eletrônica é impressionante. Quais são suas principais influências nesses dois gêneros?

Adoro misturar R&B e música eletrônica, que gosto de chamar de “Sci-Fi R&B”. Minhas principais influências são nostálgicas por natureza, mas futurista no tipo de som eletrônico que procuro. Eu parto daquelas super baladas, sabe, tipo Whitney Houston, Mariah Carey, Toni Braxton, essas cantoras realmente emocionantes e depois misturo isso com um pouco de R&B dos anos 1990. Esse é o tipo som que eu tento apresentar.

Em termos de música eletrônica, eu sempre gostei do som mais pesado, tipo hard house, que gosto de misturar com hip-hop pra onde vai dar. Eu realmente gosto de sons profundos. E eu sou meio nigeriana, então você sabe que o tambor falante é uma coisa muito importante na minha cultura, e eu sinto que desde que ouvi esse instrumento, isso passou a conduzir toda a música que eu crio. A batida do tambor é a primeira coisa que crio e é a primeira coisa que quero que todos ouçam também, aquela batida pesada.

Quais são as expectativas de tocá-la ao vivo para o público brasileiro?

Estou muito animada para apresentá-lo para o público brasileiro. Esta é a primeira vez que estou no Brasil. Eu fui para a Argentina e foi minha primeira vez na América do Sul. Me apresentei em setembro e foi incrível. Mas eu sempre quis vir para o Brasil e acho que o público que vai entender o que estou dizendo, sabe? É experimental, é futuro, é nostálgico. Tem bastante para as pessoas se conectarem, mas espero que aproveitem minha narrativa conceitual também. Também vou trazer um pouco drama, claro. Estou trabalhando em como trazer tudo isso para o palco e estou super animada!

Que novas obras está a preparar para o futuro? Algum novo recorde a caminho?

Em termos de música nova, sim. Ainda não tenho uma data para o meu novo lançamento, mas vou apresentar algumas das minhas novas músicas no show neste fim de semana. Eu tenho algumas novas faixas fantásticas. Eu só quero testá-las e ver como eles saem. Ainda estou na mesma proposta do Metal, mas um pouco mais…. não sei…. você vai ter que me dizer o que pensa sobre isso. Mas sim, muito empolgada. Então, se liguem, nova música chegando. Provavelmente março do próximo ano.

O que você sabe sobre a cena eletrônica brasileira? Quais são suas expectativas ao vir para o No Ar Coquetel Molotov?

Na verdade, descobri a música eletrônica brasileira pela primeira vez quando conheci Linn da Quebrada há alguns anos em Londres. E eu sempre amei o que ela estava fazendo. Eu adoro esse rap e forma de cantar experimental e tenho bastante batidas de hip hop. Então eu sempre achei bem divertido. Também acompanho a BADSISTA há um tempo e conversei com ela sobre fazermos projetos juntas, o que seria lindo. Então, esperamos que possamos nos conectar no futuro.

Tem vários artistas brasileiros com os quais tenho me relacionado e a última que vi recentemente foi a MC Carol. Estou realmente animada para me apresentar no mesmo palco que ela. Acho que isso vai ser foda. E só agora estou ouvindo Brega Funk e, tipo, tô curtindo muito! Eu conhecia o Baile Funk antes e acho que vai ser muito interessante ver como esse som evoluiu. Sobre minhas expectativas para o festival, bom, não sei o que esperar. Estou muito animada por estar aqui, então vou dar tudo de mim e espero que todos gostem do show. Vamos nos divertir.

Revista O Grito! é uma das mídias oficiais parceiras do festival, ao lado da Revista Continente, Eu Curto Recife, Hipster Recifense, Frei Caneca FM, Poline.Biz, Universitária 99.9 FM e S.O.M.