A nova literatura judaica

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Foto de Jaffa, que faz um trabalho fotográfico sobre os conflitos na região, o Photo Voice

LITERATURA PRA DENUNCIAR O MAL
Nova geração de autores judeus que nasceram em Israel tem um interesse pop e político sobre os conflitos atuais da região

Por Paulo Floro
Editor da Revista O Grito!

Em 6 de maio deste ano, escritores israelenses e palestinos celebraram cada um, seus festivais de literatura. O Festival Palestino de Literatura, em Ramallah, na Cisjordânia e o Festival Internacional de Escritores de Israel, na capital do país, Tel-Aviv, acentuou a divisão da região. Jornalistas de outras partes do mundo que cobriam os eventos aproveitaram para levantar a questão de como esse sectarismo é visto por pessoas ligadas às letras e descobriram o que já era notório nos livros e discursos: a nova literatura feita em Israel quer discutir as diferenças.

Nomes contemporâneos como David Grossman, Jonathan Safran Foer, Daniel Mendelsohn, A.B. Yehoshua, Nicole Krauss e o mais famosos autor israelense, Amos Oz, praticamente não conversam entre si, mesmo morando na mesma cidade. No entanto, todos, tem em seu discurso uma inquietação com relação a essa falta de interação literária, mesmo morando na mesma cidade, mesmo local. Grossman, um dos palestrantes nesse festival, é um dos mais pacifistas. O autor esteve no Brasi no final do ano passado para promover seu mais recente livro, A Mulher Foge (Companhia das Letras). Ele acredita que a literatura pode sim ser utilizada como arma para denunciar o mal causado pelo conflito.

Em seu novo livro ele conta a história de uma mulher que atravessa todo o país para não correr o risco de ter o conhecimento da morte de seu filho caçula, que morreu na guerra. É uma narrativa emotiva de como as pessoas criaram artimanhas para se defender da dor causada pelos confllitos. O próprio Grossman tem conhecimento de causa. Em 2006, ele perdeu Uri, seu filho, num combate no Líbano. Com mais de 20 livros publicados em diversos países, ele sempre guarda o interesse no aspecto político nas obras.

Outro que escreve com propriedade é A. B. Yehoshua, que serviu durante anos no serviço militar de Israel. O autor mostra interesse em retratar o modo de vida e o cotidiano do israelense mediano, seus hábitos, e assim, tenta entender sua história. Harold Bloom, o famoso crítico norte-americano já o comparou com o escritor William Faulkner, vencedor do prêmio Nobel. Aos 73 anos, é curioso Yehoshua não ter ainda seu clássico. O Brasil tem algumas de suas obras traduzidas e lançadas pela Companhia das Letras. O mais recente, publicado ano passado é A Mulher de Jerusalém, que tem com foco central da trama um atentado terrorista. Sua militância, entretanto, é o que se destaca em seus mais de dez livros. Mas, ao contrário de Grossman, mais simpático aos signatários pacifistas internacionais, Yehoshua critica fervorosamente os assentamentos judaicos, mas também os palestinos. Membro do Movimento Pacifista de Israel (Israeli Peace Movement), ele recebeu duras críticas quando defendeu que uma vida judaica completa só poderia existir em um estado judeu.

Essa declaração controversa do autor tem um valor histórico. Ao lado de Grossman e Amos Óz, ele forma a primeira geração de escritores judeus que nasceram em Israel. Com suas convicções políticas rígidas, seria claro que existisse algum interesse em entender o nacionalismo israelense, sempre cheio de polêmica entre o próprio povo. Oz, seja talvez uma das vozes mais conhecidas por uma paz na região. Foi ele um dos fundadores do Shalom Akhshav, o Paz Agora, movimento que logo ganhou projeção internacional. Isso depois do autor ter participado como da Guerra dos Seis Dias e da Guerra do Yom-Kippur.

Antes deles, nomes como Philip Roth usavam o humor, o sarcasmo pra mostrar a inadequação às tradições. Roth, filho de imigrantes fugidos do Nazismo, olhou com desencanto para o passado, mostrando até mesmo um novo olhar como esse judeu espalhado pelo mundo se comporta emocionalmente com a história secular, a religião, o sofrimento passado no Holocausto. Em seu livro mais famoso, Complexo de Portnoy, o protagonista, um viciado em masturbação (talvez outra referência cínica a uma busca por identidade), viaja ao final para Israel.

Essa geração passada, refletiu sobre o impacto que as provações do passado, sobretudo as perseguições na Europa trouxe para os judeus na América. Nos EUA do pós-guerra, o povo de Israel pôde se se beneficiar da cultura capitalista e muitos prosperaram. Antes deles, escritores judeus de diversas nacionalidades, como o tcheco Franz Kafka e o italiano Primo Levi, tinham outras questões, mas o conteúdo sempre esteve presente.

Os escritores dessa Israel contemporânea, mais do que todos, se interessam pelo que há de político na literatura e o que ela pode fazer para transformar o mundo em que vivem. Talvez, num futuro ainda obscuro, as feiras literárias simultâneas que acontecem na região possam, enfim, conversarem, se celebrarem. Outro evento literário, desta vez no Brasil, vai poder acender o debate esse ano. A Festa Literária Internacional de Pernambuco, a Fliporto, dedica o tema da edição deste ano à literatura judaica. O evento acontece em novembro em Olinda.

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