Cobertura: Sigur Rós

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Sigur Rós (Foto: Rob Walbers/ Divulgação)

VIAGENS DE OUTRO MUNDO COM O SIGUR RÓS
Uma das bandas mais respeitadas do pop atual surpreende em show do novo álbum
Por Gabriel Gurman, de Leuven (Bélgica)

SIGUR RÓS | 6 de julho de 2006
Festival Rock Werchter – Leuven

A música expressa o que não pode ser dito em palavras, mas não pode permanecer em silêncio.
Victor Hugo.

Sempre que preciso escrever sobre algo que realmente mexeu comigo, mas que julgo que não conseguiria transpor em palavras minhas emoções, penso em como eu explicaria tudo aquilo para um extraterreste recém-chegado à Terra. Tudo descrito e explicado minuciosamente. Quando o assunto é a banda islandesa Sigur Rós, acho que seria mais fácil que este ser alienígena me explicasse o que aconteceu comigo – e com mais 90.000 pessoas – em uma noite ensolarada (!!) da cidade belga de Leuven, mais especificamente, no festival Rock Werchter.

O festival acontece em um grande espaço gramado afastado em 15km da cidade. Como estamos na Europa, há transporte gratuito para todos até o local dos shows que, apesar de comportar quase cem mil pessoas por dia (são quatro dias de festival), se mantém limpo e organizado. Aliás, limpo até a chuva transformar a grama em lama. Mas este é apenas um detalhe quando se olha as principais atrações do Rock Werchter: R.E.M. Chemical Brothers, Neil Young, The Verve, Jay-Z, Digitalism, Gossip, Hives, Kings Of Leon, Radiohead, Gnals Barkley, Kaiser Chiefs, Raconteurs e… Sigur Rós.

Admito que o grande motivo da minha felicidade quando os integrantes dessa banda Islandesa entrou no palco, foi que o Radiohead (banda que eu já havia assistido o show em Milão) seria, finalmente, a próxima atração. Não que eu esteja reclamando, mas correr de um palco para outro, o dia inteiro, cansa! Mas tudo começou a mudar nos primeiros acordes de “Svefn-g-englar”, música que eu já conhecia, mas não lembrava de onde – mas que, mais tarde, o Google me contou que era da trilha do filme Vanilla Sky. E foi então que tudo começou a mudar.

Porque, ao contrário do que eu disse acima, não foram “os primeiros acordes”. O vocalista e guitarrista Jonsi Birgisson, que toca seu instrumento com o auxílio de um arco para Cello, abusando do reverb e dono de um falsete impressionante, sozinho, já hipnotizaria qualquer espectador. Mas Birgisson está acompanhado. Aliás, muito bem acompanhado. O Sigur Rós é completado pelo trio Georg Hólm (baixo), Kjarri Sveinsson (teclado) e Orri Páll Dýrason (bateria), além de músicos de apoio que completam e dão mais vida à plenitude melódica com suas cornetas, violinos, trompetes e o que mais couber no particular planeta em que a banda vive e nos faz viver durante o show.

O som da banda cobre todo aquele espaço gigantesco. A indecisão entre fechar os olhos para oferecer apenas os ouvidos para ouvir aquelas palavras estranhas que Birgisson emite e ver todos aqueles músicos caracterizados com roupas, maquiagens e com um cenário simples mas belo, parece que não assola apenas a mim. Uma situação curiosa é que mesmo aqueles fãs de longa data não cantam as músicas – por elas serem no “infalável” islandês -, mas murmuram as melodias e explodem nos riffs. Se o rock é a desordem, o Sigur Rós faz algo diferente, está “fora da ordem”. Não é rock, não é eletrônico, não é sutil, não é barulhento. Não é música para um dia qualquer e sim música para transformar um dia qualquer em um dia diferente.

O recém-lançado álbum Með Suð í Eyrum Við Spilum Endalaust foi a base do show – foram quatro músicas do disco – e o principal destaque vai para “Inní Mér Syngur Vitleysingur” que lembra – de longe – algumas músicas da banda canadense Arcade Fire. De longe, pois aos poucos a canção vai crescendo e crescendo e crescendo. Você fecha os olhos e pensa “como uma música que eu não consigo entender uma só palavra me faz sentir desse jeito?”. É então que a própria banda, em forma de mais uma obra-prima responde. “Gobbledigook” é a síntese daquela noite. Mais de uma dezena de pessoas em cima do palco cantando, batendo palmas, cores, luzes e então começa uma chuva de papel picado. OK, todos nós já vimos isso antes. Se eu não me engano até mesmos cantores sertanejos já usaram desse artifício para seduzir o público. Mas a canção se transforma em música tribal, abusando de tambores, e todos os integrantes entram em uma dança peculiar. Aqueles papéis, que aos poucos caem, faz cada uma das testemunhas se sentir parte da tribo.

O único ponto fraco do show foi o final. Ou melhor, não o final, mas o fim em si. Eu, que não estava esperando nenhuma música em especial (até porque seria bastante complicado gritar “toca ‘Viðrar Vel Til Loftárása'”, por exemplo), já tinha até esquecido qual seria o próximo show. Se existe algum problema nos festivais de rock, é esse: o curto tempo para as bandas se apresentarem. Verdade seja dita, o Sigur Rós conseguiu fazer com a atração seguinte se tornasse “apenas” uma banda de rock normal. E, aliás, essa próxima atração era o…