Crítica-HQ: Biografia em quadrinhos de Marx destaca vida pessoal do revolucionário socialista

Divulgação.
7.5

Misto de biografia e ensaio, HQ tem humor e leveza para falar do pensador que atiçou o fogo da história

No ano do bicentenário do filósofo Karl Marx, o mercado editorial está recheado de títulos que disputam atenção para a efeméride deste ano. Mas, certamente, poucos serão tão interessantes e dinâmicos quanto esta HQ da suíça Corinne Maier e da francesa Anne Simon. A obra aborda a vida de Marx a partir da construção de sua obra, um conjunto radical de ideias que imaginava um mundo livre de desigualdade e exploração do trabalhador.

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Marx usa ideias bem interessantes de design aplicados a uma narrativa mais tradicional de quadrinhos para criar painéis que explicam em detalhes o ideário de Marx. Em paralelo é contada a história de sua vida, desde sua infância em Trier, na Renânia, até as atribuladas reuniões da Internacional Comunista. No escopo de personagens, quem ganha destaque é sua mulher, Jenny (Jenny von Westphalen), que foi uma de suas maiores apoiadoras e com quem conviveu desde criança. Engels, evidentemente, também está presente, um burguês revolucionário que foi tanto apoiador quanto financiador de Marx. O dinheiro sempre foi um problema para Marx, que passou grande parte da vida à beira da falência, dependendo de ajuda de amigos e de heranças esparsas da esposa.

A obra se esforça em contextualizar a figura histórica de Marx ao deixar claro suas falhas morais, suas contradições e o fato de ter abraçado algumas contradições de forma voluntária (ele possuiu uma empregada doméstica a maior parte do tempo e chegou a engravidá-la). Os arroubos autoritários também são bem presentes. Desse modo, a obra enaltece a persona do filósofo em toda sua complexidade e imperfeição. A HQ mostra também as tretas entre as diversas facções do comunismo imaginado pelo filósofo, mas esses pensamentos divergentes são pouco explorados no livro.

Maier e Simon são conhecidas pelas HQs cheias de ritmo e muito uso de alegorias visuais, o que faz das obras um misto de biografia e ensaio. Outro trabalho da dupla já saiu no Brasil, Freud, pela Companhia das Letras. Marx é mais denso e um pouco mais complexo, ainda que o texto do gibi seja bastante inclusivo, tornando a leitura agradável a todo mundo. Algumas passagens chegam a ser didáticas, mas nunca maçantes.

Gastando bastante tempo em detalhes da vida pessoal do filósofo, a HQ pareceu apressada nas dez páginas finais, o que me soou muito condensado em comparação com o início divertido e solto. Talvez fosse necessário um pouco mais de tempo para se ater aos detalhes da publicação de O Capital e os momentos finais da vida de Marx, bem como a relevância de sua obra para os anos vindouros. Soou abrupto, mas aqui é bom destacar que traduzir as ideias socialistas revolucionárias para uma audiência massiva no século 21 não é tarefa fácil.

Em tempos em que a diversidade de pensamento se vê ameaçada no Brasil, qualquer publicação sobre Marx ou o marxismo chega a soar como provocação, resistência. Que essa divertida e leve biografia do filósofo possa servir como uma porta de entrada para uma reflexão da importância das ideias de Marx. “As crises atuais se parecem com as que vivi”, diz um onisciente Marx nesse quadrinho. “Só há uma saída: a revolução!”.

MARX – UMA BIOGRAFIA EM QUADRINHOS
De Corinne Maier e Anne Simon (texto e arte)
[Barricada/Boitempo, 64 páginas, R$ 45 / 2018
Tradução de Mariana Echalar

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