Crítica: O Gosto do Cloro, de Bastien Vivés

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ENCONTROS E DESENCONTROS
Revelação dos quadrinhos franceses, obra minimalista chama atenção para aquilo que não se pode expressar em palavras

[Recomendado]

Algumas poucas obras da cultura pop hoje em dia nos pedem para desacelerar. E é esse raro momento de contemplação, de suspensão, que propõe a HQ O Gosto do Cloro, que a editora Barba Negra coloca nas livrarias e comic shops. Criada pela revelação francesa nos quadrinhos, Bastien Vivès, o livro se passa inteiramente em uma piscina de clube e acompanha momentos corriqueiros na vida de um garoto que começa a nadar para tratar um problema de coluna, mas acaba despertando interesse em uma frequentadora do lugar.

O leitor passa então a acompanhar essa lenta aproximação dos personagens, ressaltando momentos triviais, como quando a garota, uma ex-campeã, ensina o garoto a executar movimentos da natação. Nenhum dos dois tem nome, nem o lugar em que se passa a história é dito, o que ressalta a intenção do autor em uma subjetividade em que se destaquem os sentimentos. O protagonista passa, então, a tentar expressar tudo o que sente pela garota numa narrativa cheia de tensão, de palavras não-ditas, de lacunas.

As cores lavadas, o traço minimalista, os longos planos sem diálogos, submersos, as pausas, trazem ao leitor uma imersão (ou melhor, uma submersão) àquela história e àqueles personagens. Vivés criou um microcosmo delicado e deixou tudo o mais simples possível para aproximar quem lê. É um trabalho singelo que cria uma contraparte ao mundo atual, repleto de hiperlinks, rapidez e comunicação otimizada. Os personagens de O Gosto do Cloro estão o tempo todo na expectativa de algo que precisa ser dito. É uma obra bastante sensorial, com destaque para a comunicação dos corpos, do silêncio, nos chamando atenção para um contexto atual de isolamento.

A piscina pode até ser usada como metáfora (estamos sempre nadando, sozinhos, a procurar companhia, como o protagonista), mas O Gosto do Cloro também consegue ser mínimo nas suas intenções artísticas. Trata-se de uma HQ com um roteiro muito bem amarrado, com uma narrativa que flui desde a primeira página até a última quando o leitor é agraciado com um pequeno mistério que garante uma experiência particular a diferentes leitores. O livro venceu o prêmio revelação do festival de Angoulême, na França, o mais importante da Europa e projetou Vivés como um dos quadrinhistas de destaque na França, com apenas 26 anos. Agora é esperar que a editora Barba Negra/Leya traga outros trabalhos de Bastien ao Brasil. [Paulo Floro]

O GOSTO DO CLORO
Bastien Vivés
[Barba Negra, 144 págs, R$ 39,90/ 2012]
Tradução: Maria Clara Carneiro

Nota: 9,1

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