DFB 2019: Primeiro dia de Dragão destaca a cultura local e traz protestos contra Bolsonaro na passarela

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Em tom de performance, Caio Nascimento protestou na passarela. (Foto: Nicolas Gondim/Divulgação).

De Fortaleza (CE)

O DFB Festival, Dragão Fashion Brasil, maior evento de moda autoral da América Latina, iniciou sua edição de 20 anos reafirmando muito da identidade que construiu ao longo de todo esse tempo: coleções que fogem da obviedade e que comunicam algo (por vezes até mesmo encampando discursos políticos corajosos).

Mas este ano a surpresa mesmo ficou por conta do novo local, o Aterro da Praia de Iracema, que contou com uma estrutura de 27 mil metros quadrados montada sob a areia, de frente para o mar. A edição ainda conta com shows, exposições, debates e uma feira de grifes e restaurantes locais.

Trabalhos de Parko, Victor Costa, Almerinda Maria, Homem do Sapato, Gisela Franck e Água de Coco e Caio Nascimento se apresentaram no primeiro dia. Destaque para este último, que trouxe algo sempre muito aguardado no Dragão, que são os desfiles com posicionamento.

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Vitor Cunha trouxe muito do imaginário do jangadeiro na coleção. (Fotos: Roberta Braga e Chico Gomes/Divulgação).

No mesmo dia em que cidades em todo o Brasil realizavam protestos contra o governo e a favor da educação, o DFB Festival, em Fortaleza, realizava um desfile cheio de teor político com críticas a Jair Bolsonaro. A estreia de Caio Nascimento trouxe um tom de performance com roupas que traziam inscrições aplicadas aos jeans, mordaças e faziam um contraponto com 1964, ano do golpe que levou à ditadura militar.

No vestuário, Caio apostou em macacões e jaquetas cropped para homens. Foi uma coleção muito bem executada, toda coesa e que, apesar de ser aparentemente simples, seu olhar para roupas do dia a dia soaram criativas, com interferências que davam um novo vigor para peças como calças, pantalonas e batas. Todas vinham com palavras de ordem como “elegância”, “paz”, “amor” e “1964 não”. Nos acessórios as bolsas da grife de couro cearense Matulão.

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Almerinda Maria e o olhar moderno da renda renascença. (Fotos: Roberta Braga e Chico Gomes/Divulgação).

Outra estreia foi a de Vitor Cunha, jovem de apenas 20 anos que fez um desfile conceitual inspirado no imaginário do jangadeiro, base da cultura de Fortaleza (e mais especificamente da Praia de Iracema, um dos cartões postais da cidade). Foi interessante ver o desfile justo no ano em que o evento se muda para o Aterro desta mesma praia. Sua coleção masculina trouxe peças em degradê, lindos tons inspirados na paisagem praeira e um trabalho muito bem executado de macramê.

As roupas seguiam uma proposta agênero, bem folgadas que permitiam ajustes nos nós de modo a cair bem em qualquer pessoa, independente do tamanho e do peso. Uma inovação bem legal utilizando algo bem simples.

Gisela Franck fez um desfile inspirado na beleza e complexidade dos jardins e trouxe roupas que se confundiam com flores, com diversas aplicações de arranjos. Gisela tem se tornando um dos destaques do evento e a cada ano apresenta coleções criativas com muito estudo de materiais e um olhar interessado em novos usos da indumentária. Para esta edição, a artista retorna mais leve, mas ainda assim inventiva em suas produções.

Almerinda Maria fez mais uma linda coleção baseada na renda renascença, um dos mais conhecidos elementos do artesanato local. Ela ainda trouxe peças com linho e gaze de seda, tudo bem executado.

O DFB segue sendo um dos mais interessantes eventos de moda por trazer inovação em desfiles que tentam o tempo todo reforçar uma originalidade local (cearense, brasileira, latina…). No fundo, o festival enaltece toda uma cadeia produtiva baseada na indústria têxtil do Ceará, que é um dos pilares da economia local.

* O jornalista viajou a convite da produção do festival.