Faixa a Faixa: Tagore Suassuna comenta Movido a Vapor

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Foto: Beto Figueiroa/Divulgação
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Tagore ao gosto da música
Cantor pernambucano reforça sua figura de promessa do pop em disco de estreia

Por Renata Arruda

O pernambucano Tagore Suassuna ganhou alguma projeção com seu EP de estreia Aldeia em 2010 mas só agora, depois de quatro anos, tendo deixado de ser solo para virar uma banda, lança seu primeiro álbum, Movido a Vapor. Segundo Tagore, não foi fácil lapidar as canções para o formato ao vivo e mesmo depois de assinar com o selo independente Cósmica e finalizar o disco, o período final de sua faculdade de Design atrapalhou a dedicação integral à música. “Agora sou da música, pra onde ela quiser me levar”, diz ele.

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Tagore Suassuna assina as letras, canta e toca violão na banda que leva seu nome e é formada ainda por Caramurú Baumgartner (percussão e voz) Diego Dornelles (baixo/guitarra/synt), Gustavo Perylo (bateria) e João Cavalcanti (baixo/guitarra/synth) em um disco de treze faixas que mesclam do baião ao rock e que ainda traz regravações de influências de Tagore como Alceu Valença (“Morena Tropicana) e Tom Zé (“Todos os Olhos”), em versões com a cara da banda, com um som cativante e animado, que faz balançar dos pés à cabeça.

Tagore conversou com O Grito! sobre o disco, sua carreira e a cena de Recife e ainda comentou Movido a Vapor faixa a faixa com exclusividade. Vale a leitura.

Poderia comentar sobre a concepção de Movido a Vapor e escolha do repertório?
O disco traz 3 musicas do nosso primeiro Ep (Aldeia, 2010) e outras canções amadurecidas nos dois anos seguintes. Fomos escolhendo as que mais se relacionavam com o universo melódico e o conceito urbano presente nas faixas do Aldeia. O resultado foi essa peculiar malha de sons, costurada por fios da cidade, do campo, das paixões e do caos.

Você assumiu o projeto que leva seu nome em 2010 com o lançamento do EP Aldeia em parceria com João Cavalcanti e agora estreia com um álbum cheio, em formato de banda, que inclusive traz algumas músicas do anterior. Pode-se falar em reestreia ou o Movido a Vapor é uma continuação natural do projeto iniciado em 2010? O que levou à (boa) distância de quatro anos entre um lançamento e outro?Eu diria que é a continuação de um ciclo iniciado no Aldeia. O hiato se deu por conta de uma série de fatores, como a mudança que foi sair da zona de conforto das gravações para formar de fato uma banda e lapidar todas as faixas para o ao vivo. Não foi fácil. Nesse processo, passamos o ano de 2011 inteiro tocando por todo o Recife. Foi então que em dezembro assinamos com a Cósmica, um selo independente de lá, e fomos convidados a gravar nosso primeiro disco. Levamos cerca de 6 meses para finalizá-lo. Depois veio um período no qual estive muito atribulado terminando minha faculdade de Design, sendo impossível me dedicar exclusivamente ao lançamento do disco, com agora faço.Agora sou da música, pra onde ela quiser me levar.

Como é a sua relação com a cidade de Recife e como você vê os movimentos como os dos Direitos Urbanos? Influenciam o seu trabalho de alguma forma?
Gosto muito de Recife, e em especial do mar. Tenho um vinculo muito forte com o mar, desde a infância, e isso se reflete em muitas das minhas canções.

Apoio qualquer tipo de oposição pacífica ao voraz poder do capital. Creio que o nosso disco traz diversas mensagens relacionadas a esses direitos e suas reivindicações.

Ainda sobre Recife, em 2010 você comentou em entrevista ao Rock n Beats que “quem faz música independente em Recife, tem que estar pronto pra ralar, por que o espaço é muito pequeno pra demanda de artistas, o público é extremamente frio e crítico” e reclamou da falta de casas de shows disposta a dar espaço para bandas autorais – o que não me parece muito diferente do Rio de Janeiro, onde vivo. De lá para cá, e com o aumento da visibilidade da sua banda, quais as mudanças você observa nesse cenário? 

Falando especificamente do nosso trabalho, acredito que não mudou muita coisa. De lá pra cá tocamos muito, mas a formação de público continua árdua. Então concentramos nossas forças em sair Brasil afora de mala e cuia. rs>

Em uma outra entrevista, dessa vez ao Globo, você falou sobre a dificuldade de conseguir cachês que permitam a circulação das bandas. Você consegue viver somente da sua música?

Me formei em Design, mas graças ao suporte dado pelo nosso selo, eu vivo apenas da música.

Repetindo uma pergunta que fiz ao músico Camões, como se destacar e alcançar um público muitas vezes resistente em um cenário onde surgem novos artistas o tempo todo?

Seja sincero e extremamente auto-crítico.

Para finalizar, o que Movido a Vapor representa para você?

Todas as boas vibes juntas numa só grama.

Tagore

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Movido a Vapor, faixa a faixa
01. Movido a Vapor
Um baião embalado por um baixo galopante e sintetizadores. Eu diria que aqui a paixão é traduzida em fragmentos fantásticos, como a imagem de um grande coração aberto, de frente pro mar, no qual reside um  jovem alimentando-se de lembranças e do possível regresso de sua amada para um dia perceber que foi de fato esquecido.

02. 2012
Essa faixa brinca com o quão preocupado vive o homem com essa antiga questão do mundo acabar por meio de vulcões, terremotos e toda sorte de infortúnio. Porém, se esquece que o maior poder de destruição reside em sua próprias mãos, como é o caso das bombas atômicas. O refrão pinta o segundo em que um desses artefatos atinge seu alvo, queimando vidas, ao passo que as congela.

03. Poliglota
Outra faixa na qual o baixo é o principal condutor da atmosfera cuja letra, como outras, trata das peculiaridades do ser humano, como os amores, a negação do tempo e a prepotência de se achar a única raça inteligente no universo. Foi a primeira música gravada por mim e pelo João em 2009, pode ser considerada a semente de todo o nosso trabalho.

04. Enciclopédia do Ser
Parece um encontro de “Taxman” com “Conversa pra boi dormir”, respectivamente Beatles e Raul, no qual a temática permanece a mesma: O ser humano e a comédia na qual foi transformada sua existência.

05. Crença
Me inspirei num caso real, acontecido em Recife, de uma garota que foi estuprada pelo padrasto e engravidou. Então foi realizado um aborto e a garota e toda a equipe médica foi excomungada pela igreja Católica… e o estuprador não.

06. Tarde Londrina
Devaneios de uma tarde tocando violão na beira do mar. É uma de nossas faixas mais universais em termos de sonoridade, bem como uma das mais chapantes.

07. Vagabundo Iluminado
Minha namorada me falou sobre o livro de Kerouac e achei o título fantástico. Então um dia, após ser “eliminado” por um desses programas de talentos musicais da Tv paga, recheado de frustração juvenil, sentei e escrevi de uma só vez esse manifesto que começa com “Toda negação é bem vinda, venha correndo que eu cresço”.

08. Ilhas Cayman
Uma visão humorada da lendária corrupção brasileira, embalada por melodias que novamente remetem a Beatles.

09. Todos os Olhos

Cover do Tom Zé que gravamos por pirar no fato dela, como tantas outras do Tom, ter um verso completamente estranho e um refrão que gruda como poucos. Tudo isso amarrado por uma letra simples e fantástica.

10. Porto Belo
Um grito de amor, inspirado pelas musas presentes nas letras tropicalistas e pela comum veneração à famosa Portobelo Road.

11. Calvário
A síntese sonora do conceito urbano/caótico presente no disco.

12. Morena Tropicana
Dispensa apresentações. Começou como uma brincadeira de carnaval e terminou como um desafio de “desencaretar” esse clássico pernambucano.

13. Lamento em Sol
Talvez a única obscura do álbum, com atmosfera e letras que remontam a uma espécie de cativeiro amoroso. Imagino essa música como uma teia.