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Primeiras impressões de Casa do Dragão: Game of Thrones reformulado, mas com potencial

Série traz narrativa violenta e repleta de intrigas políticas que remetem ao melhor de GoT. Série ainda busca o próprio brilho, mas traz um elenco afiado

Casa do Dragão, ou House of The Dragon no original, estreou neste domingo (21) na HBO e na HBO Max cercado de expectativa por conta de sua série derivada, Game of Thrones. A saga desse spin-off é focada em uma disputa de poder da família Targaryen e se passa cerca de 200 anos antes dos acontecimentos mostrados em GoT. Pelas primeiras impressões, a série mostra que tem muito potencial, sobretudo por conta do bom elenco, do tom de intrigas e politicagens que fez bem à série original em seus primeiros anos e também, claro, por conta dos dragões.

A trama acompanha a família real Targaryen, que governa os Sete Reinos por mais de cem anos, em meio a uma disputa de poder pelo Trono de Ferro (que nesta versão ocupa uma sala inteira e é bem mais imponente). Após o rei Viserys I perder a rainha e seu filho no parto ele precisará escolher quem será seu sucessor. Como o monarca tem apenas a princesa Rhaenyra como filha, uma batalha pela sucessão se inicia e o reinado pode passar para o seu o seu irmão, o príncipe Daemon Targaryen, uma vez que nenhuma mulher governou Westeros até então.

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Não dá ainda pra saber se a série vai possuir o mesmo vigor da produção original por conta de um único episódio, mas já temos aqui algumas primeiras impressões para levar em conta.

Mais Game of Thrones do que Game of Thrones

Game Of Thrones entrou para história como uma série ousada que apontava novos horizontes para as narrativas de fantasia na TV. Violenta, brutal e apostando em altas doses de conteúdo político na luta por poder, a produção inspirada nos livros de George R. R. Martin passeava com desenvoltura entre Tolkien e Shakespeare. Porém, com o tempo, a série passou a responder a uma demanda por audiência que diminuiu seu impacto. À medida em que se afastava do material original que adaptava, GoT se tornava cada vez mais boba e perdida em suas tramas. O final, odiado por muitos fãs, trouxe um gosto amargo de quem acompanhou a série por quase uma década.

Casa do Dragão traz em seu primeiro episódio uma energia cheia de vigor que lembra o início cheio de originalidade de Game of Thrones. E os produtores estão cientes da controversa última temporada da série original e estão fazendo de tudo para consertar os erros por aqui. O tom de intriga política e as guerras por influência e poder dão o tom da narrativa, o que sempre foi o forte do enredo de Martin. A fantasia cria o chamariz para atrair o público, evidentemente, mas GoT se fortalece enquanto produto cultural quando não se rende ao tom aventuresco puro e simples. Dragões, castelos medievais, seres mágicos, etc, funcionam melhor quando se integram a essa narrativa coesa de violência e poder.

Mas aí aparece um outro problema: será que Casa do Dragão vai conquistar sua própria personalidade ou será para sempre dependente de sua série-mãe, tanto na estética quanto na narrativa? Se os produtores seguirem utilizando o seriado como uma forma de redenção em relação ao péssimo final de Game of Thrones, a série vai ter cada vez mais cara de GoT 2: A Missão, o que não seria um problema assim tão grave, em certa maneira.

Sexo reformulado (mas nem tanto)

Matt Smith, que interpreta Daemon Targaryen, um dos protagonistas, vem reclamando do modo como o sexo vem sendo filmado na série. No primeiro episódio seu personagem aparece transando em um prostíbulo com a personagem interpretada por Sonoya Mizuno, porém não consegue manter a ereção. Nada é mostrado de maneira explícita e o ator faz um uso preciso de um lençol para esconder a genitália. O ator disse que os coordenadores de intimidade acompanharam a cena, mas que espera que cenas assim “não sejam usadas de maneira gratuita”.

A série original já foi acusada de objetificar o corpo feminino e por mostrar seios e vagina de maneira explícita, enquanto que escondia quase sempre os pênis dos homens. Há também críticas ao modo como o sexo era mostrado em cena, sem relevância para a trama, ou mesmo a maneira como o estupro era naturalizado em alguns momentos. Casa do Dragão pareceu mostrar neste episódio que está tentando lidar com essas questões sem perder a essência. Afinal, em um mundo brutal como Westeros, o sexo é também um espaço de disputa.

Em outra cena relacionada temos o Mão do Rei, Otto Hightower , interpretado por Rhys Ifans, sugerindo à sua filha Allicent (Emily Carey) que ela se ofereça ao rei recém-viúvo. É tudo muito sutil, mas mostra como os jogos de afeto também fazem parte da intrincada trama pelo trono no reinado Targaryen.

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Matt Smith em uma das cenas mais sangrentas do primeiro episódio. (Divulgação/HBO).

Daemon e Rhaenyra levando a série nas costas (de um dragão)

A saga de Casa do Dragão se passa em duas fases, uma com Rhaenyra adolescente e outra com ela já adulta e favorita ao Trono de Ferro. A atriz que interpreta a princesa jovem é a relativamente desconhecida Milly Alcock. Ela conseguiu entregar as nuances de uma jovem nobre que sente a pressão de ser a única filha de seu pai, que sempre aguardou um filho homem como sucessor. Pra completar ela tem o ímpeto de guerreira, porém está sendo criada como uma jovem da nobreza para casar e ter filhos. Já no primeiro episódio temos um arco de evolução bem grande da personagem, que vai rivalizar com o seu tio, Daemon, pelo trono.

Falando em Daemon, o ator que interpreta o irmão mais velho do rei é interpretado por Matt Smith, rosto mais conhecido de Casa do Dragão. Conhecido por interpretar uma versão de Doctor Who, o ator dá vida ao Targaryen com ares tirânicos. As cenas de sexo e as passagens mais brutais de violência nesta estreia estão em torno de seu personagem. O restante do elenco, porém, não fica por baixo, como Paddy Considine, como o rei Viserys I e o misterioso casal interpretado por Steve Toussaint e Eve Best.

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Um dos dragões da série: mais do que armas. (Divulgação/HBO).

Dragões, muitos dragões

Em uma entrevista concedida antes da estreia, o diretor Miguel Sapochnik destacou a importância de fazer os dragões parecerem reais, orgânicos. E nisso a HBO não economizou. Já nos primeiros minutos vemos Rhaenyra singrando os céus montada em Syrax, seu dragão. E ele nem é um dos maiores. Caraxes, o dragão vermelho de Daemon apareceu quase no fim do episódio e ele é… enorme!

Assim como aconteceu nas temporadas finais de GoT, os dragões ganharão mais personalidade e terão uma presença mais marcante e soarão mais como personagens e menos como “armas” ou “veículos de combate”.

Comentário ao patriarcado real

A trama de Game of Thrones se baseava muito em uma disputa de poder baseada no choque entre valores (ocidente x oriente, Westeros e Essos) e a batalha entre a emergência de um novo poder e a decadência de uma estrutura em meio ao fim do mundo (“o inverno está chegando”). Casa do Dragão, que se passa quase duzentos anos depois, traz alguns elementos dessa proposta, mas seu maior comentário talvez seja a luta do patriarcado para se manter no poder.

O rei Viserys I e a rainha Aemma Arryn esperam um bebê e a expectativa é que seja um homem para suceder o monarca. Sua esposa já vem de cinco tentativas frustradas de ter um filho e já não aguenta mais tanto sofrimento. Viserys já é pai de Rhaenyra, porém caso ele não consiga um primogênito do sexo masculino, o trono pode passar para o seu irmão, o príncipe Daemon, por conta de um precedente estabelecido anos atrás em outra crise de sucessão. Ou seja: nenhuma mulher jamais governou Westeros.

Resta saber como a série vai utilizar esse argumento e como essas disputas de poder poderão trazer algo de novo nessas narrativas de sucessão.