Rec-Beat 2020: Bad do Bairro abalou as estruturas do Cais da Alfândega

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Fotos de Jonatan Oliveira.

Para a segunda noite de carnaval (domingo, 23/02), o RecBeat 2020 descartou nomes muito badalados, com mais tempo de estrada e shows consagrados e apostou em artistas que ainda estão despontando. Podemos garantir que mais uma vez a organização do festival acertou no alvo, trazendo para o palco do Cais da Alfândega apresentações maravilhosas que deixaram o público a mil. Todos de alguma forma vinculado à música eletrônica, Nina Oliveira, Josyara, Bad do Bairro, N3rdistan e Omulu trouxeram aquela energia bacana do prazer de tocar e cantar para uma galera que está aberta para múltiplas sonoridades e estilos.  

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A apresentação mais babado foi, sem dúvida, a de Jup do Bairro e BadSista, o Bad do Bairro. Com seu “corpo sem juízo” ela mostrou como a apropriação da sua vivência transformada em arte por meio da música ainda vai lhe levar longe nos palcos. Performática e tirando proveito de sua voz grave, Jup canta as transformações pelas quais passou de forma intensa e sem meias palavras. É papo reto. Fala de punheta, boquete, lamber buceta mas também das suas mudanças, como pessoa trans, como quando disse: “Mãe! Eu quero ser mulher” e a mãe respondeu: “fazer o que né, fazer o que né…” Jup já tem muitas fãs, sobretudo do público LGBTI+ que delirou com as músicas “Vou te foder” e “Corpo sem Juízo”.

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Jup mandou um papo reto, sem hipocrisia. (Foto: Jonatan Oliveira).

Jup continua acompanhando Linn da Quebrada em seus shows e agora está se jogando com força no projeto Bad do Bairro junto coma produtora Bad Sista, uma conexão que segundo a própria Jup mescla a vivencia de ambas na periferia de São Paulo e a abertura para o experimento e o improviso. As letras da dupla falam das pessoas trans e usam a irreverência para expressar os desejos de quem não aguenta mais tanto falso moralismo e conservadorismo. Suas músicas reposicionam os corpos excluídos e perseguidos e se tornam politicamente um grito de liberação.

Outra grata surpresa foi a apresentação do duo marroquino N3rdistan. Walead Ben Selim e a cantora Widad Broco trouxeram do país norte-africano uma mistura de eletro-rock, rap com a sonoridade da música feita em seu país que mescla ritmos de influência árabe e berbere. Bem Selim passeia por melodias que remetem a cantos místicos e o fio condutor de sua música são os poemas dos séculos luminosos da cultura árabe (entre os séculos 8 e 13) como Al Maari, cujo poema serve de base para a canção “Ya Ouma” e também autores contemporâneos a exemplo de Nizar Qabbani, um crítico da sociedade árabe atual, que inspira a canção “Maliha”.

Duas jovens cantoras debutaram no Rec-Beat com apresentações bem bacanas. A paulista Nina Oliveira abriu os shows do domingo com as músicas do seu primeiro disco, canções que celebra a força da mulher negra e questões feministas como “Dandara” e “Disque Denuncia”. A baiana de Juazeiro Josyara começou cedo imitando as cantoras que admirava – Cassia Eller e Marisa Monte – por cantarem e tocarem violão. Josyara seguiu esse caminho e foi incorporando o trabalho de outros artistas e ritmos coo a música afro. Hoje apresenta um trabalho maduro e consistente, uma sonoridade meio intimista, mas com um balanço maneiro que contagiou o público do Rec-beat. 

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O duo N3rdistan. (Foto: Jonatan Oliveira)

A última atração da noite foi o DJ Omulu que subiu ao palco às 00h37 e fez a galera dançar com suas mixagens e arranjos com músicas de diversos hits que vão de Pablo Vittar, passando por Wesley Safadão e o brega-funk de Shevchenko e Elloco. É bom lembrar que as DJs que estão tocando nos intervalos entre as apresentações também estão abalando. Ontem foi a vez de Nadejda. Também estamos ligados na atuação das/dos intérpretes de Libras. A tradutora desse domingo estava super integrada aos shows e nem a irreverência de Jup do Bairro a desconcertou. Ninguém ficou voando. Todos e todas incluídos.